1VRPSP – PROCESSO: 1081306-04.2019.8.26.0100
LOCALIDADE: São Paulo DATA DE JULGAMENTO: 06/02/2020 DATA DJ: 10/02/2020
UNIDADE: 14
RELATOR: Tânia Mara Ahualli
JURISPRUDÊNCIA: Procedente
ESPECIALIDADES: Registro de Imóveis
Conferência de bens – rerratificação. Contrato social – objeto – alteração – elemento essencial. Novação. ITBI – recolhimento.
íntegra
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – COMARCA DE SÃO PAULO – FORO CENTRAL CÍVEL – 1ª VARA DE REGISTROS PÚBLICOS
Processo Digital nº: 1081306-04.2019.8.26.0100
Classe – Assunto Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS
Requerente: 14º Oficial de Registro de Imóveis da Capital
Requerido: Building Company Participação e Administração Ltda
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Building Company Participação e Administração LTDA, diante da negativa em se proceder ao registro da escritura pública de retificação, ratificação e aditamento, pela qual José Luiz da Silva e sua mulher Rosana Ronchesi e Meide Amélia Ronchesi transmitiram, a título de conferência de bens à suscitada, o imóvel matriculado sob nº 124.229.
Juntamente com a escritura foram apresentadas a 1ª e 5ª alteração do contrato social, pretendendo a suscitada, pela mesma escritura, a retificação da conferência de bens registrada sob nº 04, na matrícula nº 124.230, para constar que o valor correto a ser conferido é de R$ 200.000,00.
O óbice registrário refere-se à ampliação do objeto da escritura retificada, o que não é possível, vez que a escritura pública registrada constitui ato jurídico perfeito e acabado, devendo a interessada lavra nova escritura de conferência de bens, bem como efetuar o pagamento do ITBI. Juntou documentos às fls.05/73.
A suscitada não apresentou impugnação, conforme certidão de fl.74, todavia manifestou-se perante a Serventia Extrajudicial (fls.12/16). Salienta que equivocadamente na escritura pública, além do imóvel matriculado sob nº 124.230, deveria constar também a matrícula n º 124.229, razão pela qual foi feita a escritura de re-ratificação. Assevera que o imposto de transmissão foi recolhido sobre a soma do valor de ambos os imóveis.
A Municipalidade manifestou-se às fls.83/84, indicando que houve a regularidade no pagamento do ITBI em relação ao imóvel matriculado sob nº 124.230. Juntou documentos às fls.85/87.
Houve nova manifestação do Registrador, corroborando os argumentos da inicial (fls.103/04).
O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.107/110).
É o relatório.
Passo a fundamentar e a decidir.
Ressalto que, em relação a averbação de retificação do valor da conferência de bens registrada sob nº 04, na matrícula nº 124.230, para constar que o valor correto a ser conferido é de R$ 200.000,00, não houve qualquer insurgência do Registrador.
Verifico que a retificação da escritura pública, para constar também a integralização do imóvel matriculado sob nº 124.229, configura alterações de elementos essenciais do negócio jurídico, tendo em vista que por livre e espontânea vontade as partes interessadas transmitiram apenas um imóvel, qual seja, o matriculado sob nº 124.230, que foi registrado e produziu todos os seus efeitos jurídicos (R.04), logo não é possível a ampliação do objeto através da mesma escritura já registrada.
Segundo o jurista Narciso Orlandi Neto:
“Não há possibilidade de retificação de escritura sem que dela participem as mesmas pessoas que estiveram presentes no ato da celebração do negócio instrumentalizado. É que a escritura nada mais é que o documento, o instrumento escrito de um negócio jurídico; prova pré-constituída da manifestação de vontade de pessoas, explicitada de acordo com a lei. Não se retifica manifestação de vontade alheia. Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, com o comparecimento das mesmas partes que, na primeira, manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico instrumentalizado.” (Retificação do Registro de Imóveis, Juarez de Oliveira, pág. 90).
A alegação da suscitada, acerca do recolhimento do ITBI sobre a soma do valor de ambos os imóveis, não prospera, vez que, de acordo com a manifestação do órgão municipal (fls. 83/84), houve o regular recolhimento do imposto somente em relação ao imóvel matriculado sob nº 124.230.
Neste contexto, a lição de Leonardo Brandelli, mencionada pela D. Promotora de Justiça, que bem explica a questão posta a desate:
“… O contrato que já esteja extinto pelo cumprimento (compra e venda registrada e paga, por exemplo) não pode ser mais retificado, embora continue exarando deveres secundários decorrentes da boa fé objetiva.
Nesse sentido, se alguém vendo o imóvel A e, após receber o pagamento e registrar a escritura, percebe que errou, e que, em verdade, deveria ter sido vendido o imóvel B, não há mais possibilidade de retificação, pois o contrato já surtiu seus efeitos e já se extinguiu pelo cumprimento; haverá em tal caso, necessidade da celebração de um novo negócio jurídico” (Teoria Geral do Direito Notarial, 4º edição. São Paulo, ed: Saraiva – 2011, p.148).
Logo, faz-se necessária a lavratura de nova escritura, como o respectivo recolhimento do ITBI em relação à nova integralização do imóvel matriculado sob nº 124.229.
Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Building Company Participação e Administração LTDA, e consequentemente mantenho o óbice registrário.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.
Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 06 de fevereiro de 2020.
Tania Mara Ahualli
Juiza de Direito