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José de Arimatéia Barbosa: Cadastro Rural ainda é pífio e a geoinformação é negligenciada

A discussão sobre como evoluíram os registros de imóveis rurais nos conduz ao cerne do Geodireito nos termos em que tem sido debatido no Comitê Geoespacial da ONU e à sua incessante pesquisa por inovações tecnológicas em geoinformação. Esta busca traz maior segurança jurídica e regulatória, due diligences cada vez mais assertivas, a ampliação do acesso ao crédito e um agronegócio cada vez mais dinâmico.

Desde sua origem em 1864, destinado inicialmente a fins estatísticos, o Registro Geral de Imóveis no Brasil passou por transformações significativas, hoje com possibilidades da realização de procedimentos anteriormente presenciais de forma online. A plataforma ONR – Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis – ilustra essa transição para o digital, otimizando processos e conferindo maior rapidez e segurança às operações imobiliárias.

Em paralelo, o papel do georreferenciamento e do Cadastro Ambiental Rural (CAR) se destaca no contexto do Sistema Registral Brasileiro mas – sabemos e vivenciamos – as dificuldades e obstáculos ainda presentes em todo este contexto. Por isto, a Geocracia buscou um dos mais renomados juristas da área, o Prof. Dr. José de Arimatéia Barbosa para esclarecer e ampliar a discussão e, tendo o tema desta entrevista exclusiva tantos meandros e especificidades, você poderá acompanhar em duas partes esta aula sobre o setor.

Como o sistema de Registro de Imóveis traz segurança jurídica em operações imobiliárias rurais? De que forma novas tecnologias têm apoiado este processo?

Para melhor responder ao que se questiona, em apertada síntese, merece destacar que o Registro Geral de Imóveis teve sua criação no ano de 1864, tão somente para fins estatísticos (Lei n° 1.237, regulamentada pelo Decreto n° 3.453/1865). Até então, todas as transações imobiliárias giravam em torno das Cartas e/ou Concessões de Sesmarias, para as quais não havia critérios objetivos destinados a identificar e discriminar perfeitamente os imóveis. Em vigor a partir de 1º de janeiro de 1976, a Lei 6.015/73 regulamenta não só o Registro do Direito da Propriedade, como também outros Direitos reais, elencados no art. 1.225 do Código Civil. 

Subsidiariamente, diversas leis especiais fundamentam as transações, quando se trata do registro de garantias reais. Por isso, a possibilidade de utilizar terras como garantia para financiamentos, utilizando-se o sistema registral brasileiro que segundo pesquisas realizadas por distintas agências, das instituições e órgãos governamentais o Registro de imóveis desponta como o mais confiável de todos, constatação que é crucial para a expansão e modernização das operações, aumentando sobremaneira a transparência e eficiência, na prática dos atos de registros e averbações das transações relacionadas, reconhecendo o poder público e os particulares usuários dos respectivos serviços, como um pilar fundamental para a segurança jurídica e o avanço do tecnológico rural no Brasil. 

De forma tecnológica, Serviço de Registro de Imóveis do Brasil recebe pedidos online, daquilo que seria presencial. Este apoio ao cartório digital vem ocorrendo através da plataforma ONR – Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, disponibilizada pelo site registros.onr.org.br   

De que maneira o Sistema Registral Brasileiro impacta o acesso ao crédito, principalmente no Agronegócio? Qual a importância do Georreferenciamento Rural e do Cadastro Ambiental Rural (CAR) neste contexto?

No que tange as operações imobiliárias rurais, em que pese tentativas infrutíferas em substituir o registro do direito da propriedade imóvel e de suas garantias reais por depósitos (sic), em instituições privadas que se autodenominam registrais, dúvida não resta, de que a segurança jurídica oferecida pelo sistema de Registro de Imóveis no Brasil é insubstituível, por isso essencial para o fortalecimento do agronegócio.  

E relação à obrigatoriedade do georreferenciamento dos imóveis nos casos de alienação, desmembramento ou remembramento, não se pode negar que objetivando conhecer a realidade da malha fundiária brasileira, com a finalidade de transformá-la, bem ou mal, foi a partir de sua vigência 2001 que as propriedades privadas se tornaram ajustadas, entre a área medida com moderna tecnologia e sua representatividade, conforme descrição tabular referida na matrícula registral a que ela se refere.

Atento aos limites de áreas e prazo para sua excitabilidade de acordo a Lei 10.267/01 que alterou específicos artigos da Lei dos Registros Públicos e regulamenta pelo Decreto 4.449/02 e alterações seguintes, o ato culmina quase sempre com a retificação desta matrícula, que uma vez encerrada é substituída por uma nova contendo os requisitos exigidos pelo artigo 176 e seus parágrafos 3º e 4º, da Lei dos Registros Públicos (Lei 6.015/73).

Há muito espera-se que o Poder Público cumpra a norma positivada, pois, passados mais de duas décadas da vigência da denominada Lei do Georrefenciamento, da mesma forma que vem fazendo o particular, também realize o georreferenciamento das suas terras.

Lamentavelmente, cumprir o que é exigido do particular, com a devida vênia, neste caso tem sido omisso o Estado brasileiro. Não só quanto ao que se debate, mas também na ausência deste em cumprir sua função social, notadamente, in casu, no tocante aos imóveis rurais de propriedade de pequenos agricultores, que medem até 4 módulos, cuja obrigação, nos termos da pertinente legislação em georreferenciá-los, sem ônus para eles, é de responsabilidade do INCRA, órgão do Poder Executivo central.  

Quanto ao CAR – Cadastro Ambiental Rural, produzido por autodeclaração pelo qual não se distingue posse de propriedade, terras privadas, públicas e devolutas, ou aquelas incidentes, às vezes, em terras ocupadas por povos originários, tais como áreas indígenas até hoje indefinidas, haja vista decisões contraditórias entre os Poderes Judiciário e Legislativo, sobre desejado marco legal, em que pese experiências exitosas, objetivando criar distintas camadas sobre a governança do território brasileiro, a exemplo do que se propõe a plataforma Rio Branco/Geocracia e outras sobre as quais adiante pontuarei.

É de se reconhecer que ainda é pífio citado cadastramento rural, pois, pelas razões expostas, ele conflita com outros cadastros, sobrepondo às vezes o que corretamente vem sendo executado pelo SIGEF. Por isso urgente é a necessidade da integração entre esses inúmeros órgãos que administram os mais diversos cadastros territoriais, quer seja no âmbito municipal, estadual ou federal transformando os em um único cadastro nacional multifinalitário, para que assim possa haver coordenação entre estes dois institutos, obviamente mantidos os objetivos de cada um, este único cadastro e registro jurídico dos imóveis.

O site Geocracia se apresenta como pioneiro em soluções de geoinformação aplicadas ao Direito e dentre alguns pontos abordados, exemplificamos: uso da geoinformação para auxiliar questões jurídicas através de plataforma própria chamada /riobranco.

Nesse sentido, a Geocracia tem muito a contribuir com a regularização fundiária com informações muito importantes, afinal, a titulação é somente uma das fases da regularização fundiária e pós-titulação, que é o desenvolvimento socioeconômico, este necessita obrigatoriamente do uso de geinformações para criar e monitorar ações e políticas públicas.

Assim, a Geocracia sendo uma plataforma bem estruturada, dispõe acerca da inteligência territorial com o expresso objetivo e análise detalhada para identificar vulnerabilidades, riscos territoriais, consequentemente colabora para o controle de investimentos. Portanto, ao realizar uma análise minuciosa, facilita e agiliza o processo de regularização de propriedades rurais.

Adoção do SIGEF como cadastro territorial básico nacional foi discutida em Oficina sobre LADM com instituições brasileiras produtoras de dados geoespaciais promovida pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, ocorrida na cidade de Recife/PE no dia 20 de outubro de 2023. Houve consenso entre os órgãos e especialistas, quanto ao potencial de institucionalizar o SIGEF como o cadastro territorial básico de referência, uma vez que ele atende aos requisitos conceituais do LADM. Neste passo, recomendou-se que seja instituído grupo de trabalho entre INCRA e MDA para avaliar a possibilidade e eventuais impactos de institucionalização do Sigef como o Cadastro Territorial Básico Nacional.

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Continuaremos a entrevista com o Dr. José de Arimatéia Barbosa na próxima semana – e está imperdível – tratando do Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP), o Sistema de Informação Geográfica de Registro de Imóveis (SIG-RI), Reurb e muito mais.

JOSÉ DE ARIMATÉIA BARBOSA é Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais. Pós-Graduado em Direito Público, Civil, Processual Civil e Direito Notarial e Registral; Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino – Buenos Aires, com estágio pós doutoral em Direito de Propriedade Europeu e Latino-americano, pela Università Degli Studi di Messina – Itália e no programa de pós doutoramento em Direito das Coisas; Direito Notarial e Direito Registral, ministrado pelo CENOR- Centro de Estudos Notariais e Registrais da Faculdade de Direito de Coimbra – Portugal; Vice Presidente Nacional do Instituto de Registradores Imoviliários do Brasil; Oficial de Registro de Imóveis e Títulos e Documentos da Comarca de Campo Novo do Parecis – MT. Ex-presidente da Associação dos Notários e Registradores de Mato Grosso. Membro do Observatório de Direitos Humanos, Bioética e Meio Ambiente junto à Università Degli Studi di Salerno- Itália e Universidad del Museo Social Argentino – Buenos Aires-AR, da qual é membro de seu Comitê Acadêmico; Professor convidado de diversos cursos de integração Jurídica e pós-graduação no Brasil e no exterior, com destaque para os países: Argentina, Espanha e Itália; Orientador de teses de vários Doutorandos e membro dos respectivos Tribunais da UMSA – Universidad Del Museo Social Argentino- em Buenos Aires, e UNICAMP- Universidade de Campinas; Exerceu atividade de Tabelião de Notas, Protestos, Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas nas Comarcas de Conselheiro Pena – MG, Alvorada e Colorado do Oeste – RO. Advogado e Procurador Geral Adjunto do município de Governador Valadares e presidente da Junta de Recursos Fiscais; Professor de Direito Constitucional na FADIVALE – Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce – Governador Valadares – MG e de Direito Notarial e Registral na UNITAS – União das Faculdades de Tangará da Serra – MT.

CADASTRO RURAL AINDA É PÍFIO E A GEOINFORMAÇÃO NEGLIGENCIADA

Entrevista: Abimael Cereda Junior (MtB 91827/SP)

Fotografia e mini-cv: Enviados pelo entrevistado

Edição: Abimael Cereda Junior e Luiz Antonio Mano Ugeda Sanches

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