Por Lisandra Paraguassu
(Reuters) – O governo federal irá apresentar na próxima terça-feira a Medida Provisória da Regularização Fundiária, mas a autodeclaração para determinação de áreas a serem regularizadas, ponto mais polêmico do texto proposto inicialmente, não constará da versão final da MP, disse à Reuters uma fonte que acompanha o tema.
O termo autodeclaração não constará em nenhum momento da legislação, destacou a fonte. Ao contrário, a nova legislação irá exigir a apresentação de documentos de comprovação de posse que demonstrem o tempo que o posseiro ocupa a terra e a situação em que ela se encontrava no momento da ocupação. Além disso, terá que ser usado o Cadastro Ambiental Rural (CAR) para verificação da situação ambiental.
“Não vai ter autodeclaração. A pessoa vai ter que apresentar os documentos para comprovar com documentos que estava no lugar e há quanto tempo. E vai ter que usar o CAR para compor como era a terra na regularização”, explicou a fonte.
O processo poderá ser feito todo de forma digital, através do site do Incra, que foi reformulado para poder atender a demanda.
Além disso, a MP irá prever que a regularização não irá valer para o futuro, para terras ocupadas sem título daqui para a frente. Será determinado um ano limite no passado até quando as terras possam ser regularizadas.
“Só vai poder regularizar para trás, para evitar que haja uma grande onda de ocupação de terras devolutas”, disse a fonte.
A MP ficou praticamente dois meses em análise na Secretaria de Assuntos Jurídicos do Palácio do Planalto, em conjunto com o jurídico do Ministério da Agricultura. Apesar da pressão do Secretário de Assuntos Fundiários, Nabhan Garcia –patrocinador da ideia da autodeclaração–, e a simpatia do presidente Jair Bolsonaro, a conclusão teria sido que a autodeclaração pura era juridicamente inviável.
A análise chegou às cortes superiores, e a informação repassada ao governo é que nem o Superior Tribunal de Justiça (STJ) nem o Supremo Tribunal Federal iriam aceitar uma autodeclaração, o que levaria a uma enorme judicialização das decisões.
A MP da regularização se transformou em um ponto de disputas dentro do governo que chegou a derrubar o então presidente do Incra, general João Carlos Jesus Corrêa, nomeado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que se opunha a autodeclaração.
No dia da demissão de Corrêa, Nabhan Garcia confirmou a jornalistas ter sido o responsável por convencer Bolsonaro da necessidade de saída do general e garantiu que a partir daquele momento a regularização iria avançar, com base na autodeclaração. A MP foi enviada ao Planalto na semana seguinte.
A ministra era contrária à ideia, preocupada com a repercussão da alteração para o agronegócio brasileiro, já pressionado pela visão de que o governo tem incentivado medidas que levam ao desmatamento da Amazônia. A mesma posição era partilhada por boa parte da Frente Parlamentar da Agropecuária.
“Havia uma preocupação de que o texto como estava podia incentivar e consolidar a grilagem de terras”, disse a fonte.
(Reportagem de Lisandra Paraguassu, em Bento Gonçalves (RS))