O plenário do Senado rejeitou por 62 votos a 15, nesta terça-feira (19/5), o substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei 1.179/2020, que altera relações jurídicas privadas na pandemia, e retomou o texto original votado anteriormente na mesma Casa. As normas são para enquanto durar a epidemia de Covid-19 no Brasil.
O PL que afeta o Direito Privado no país durante a epidemia e o destaque do PDT, que prevê o início da vigência da Lei de Proteção de Dados em agosto de 2020, vão agora à sanção presidencial.
Em 29 de abril, o governo federal havia adiado a vigência da LGPD para maio de 2021 — segundo consta na Medida Provisória 959. A MP, no entanto, pode caducar no final de junho.
O anteprojeto do PL 1.179 foi elaborado por um grupo de juízes, ministros de tribunais e advogados especialistas em direito privado, sob a liderança do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal.
Segundo Otavio Rodrigues, advogado e professor de Direito Civil da USP, “a aprovação do PL foi uma vitória para a sociedade e um exemplo de cooperação bem-sucedida entre magistrados, parlamentares, universidade e advocacia”.
Para Rodrigues, que coordenou com o ministro Antonio Carlos Ferreira (STJ) o grupo de juristas responsável pelo anteprojeto, “o texto reflete ainda a contribuição dos juristas Arruda Alvim, Paula Forgioni, Fernando Campos Scaff, Rodrigo Xavier Leonardo, Rafael Peteffi da Silva, Francisco Satiro, Marcelo von Adamek, Roberta Rangel e Gabriel Nogueira Dias, além de várias contribuições recebidas de institutos e associações”.
Outro fator que se mostrou decisivo para rápida tramitação, segundo Rodrigues, está na qualidade dos parlamentares envolvidos no projeto, como os senadores Antonio Anastasia (PSD-MG), Simone Tebet (MDB-MS) e o deputado Enrico Misasi (PV-SP), todos sólida formação jurídica.
TV ConJur
O projeto de lei foi alvo de uma série de debates em seminários virtuais promovidos pela TV ConJur na série “Saída de Emergência“. Neles, especialistas analisaram, por exemplo, reflexos da pandemia nos contratos empresariais, teoria da imprevisão e a responsabilidade civil durante a crise, dentre outros. O projeto original é de autoria do senador Anastasia.
Votação
Em sessão remota nesta terça, os senadores rejeitaram o substitutivo da Câmara. A matéria havia sido aprovada no Senado no mês de abril e, em seguida, enviada aos deputados. Modificado, o texto retornou ao Senado como um substitutivo, para mais uma votação. Como o substitutivo foi rejeitado, o projeto do Senado agora segue para sanção da Presidência da República.
De acordo Anastasia, o projeto visa atenuar as consequências socioeconômicas da epidemia, de modo a preservar contratos, suspender determinados prazos e evitar uma judicialização em massa de processos.
Questões tributárias, administrativas, de natureza falimentar ou de recuperação empresarial não foram incluídas, e serão tratadas por outros projetos em tramitação no Congresso.
O texto cria regras transitórias que, em certos casos, suspendem temporariamente algumas exigências legais. Prevê, por exemplo, que não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo ajuizadas até 30 de outubro de 2020, desde que as ações tenham sido iniciadas a partir de 20 de março.
Também suspende até a mesma data o prazo de prescrição de processos em trâmite na Justiça, assim como os prazos de aquisição de propriedade mobiliária ou imobiliária por meio de usucapião.
Substitutivo
O substitutivo da Câmara, aprovado na quinta-feira passada pelos deputados (14/5), retirou do texto um dispositivo que previa a redução de 15% das comissões cobradas dos motoristas pelos aplicativos de transporte, como Uber, Cabify e 99.
Em seu parecer, a senadora Simone Tebet esclareceu que esse dispositivo havia sido inserido no texto por emenda do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), para garantir que, até 30 de outubro deste ano, as empresas repassassem aos motoristas ao menos 15% a mais em cada viagem realizada, reduzindo proporcionalmente os valores atualmente retidos por elas.
A emenda também proibia o aumento dos preços cobrados nas viagens, como forma de evitar que o ônus fosse repassado aos usuários do serviço. Ao rejeitar a modificação feita pela Câmara, a senadora lembrou que a emenda de Contarato recebeu apoio da maioria dos senadores, com 49 votos favoráveis e 27 contrários.
“De lá pra cá, não existem fatos novos que possam sustentar, a meu ver, uma mudança de posicionamento da maioria já formada a respeito do assunto”, declarou a relatora.
Proteção de dados
Outra alteração feita pelos deputados refere-se à entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD — Lei 13.709, de 2018). O texto do Senado adiava para janeiro de 2021 a vigência da lei, com multas e sanções administrativas válidas somente a partir de agosto de 2021.
O relator na Câmara dos Deputados, deputado Enrico Misasi (PV-SP), aceitou apenas a prorrogação do prazo relativo à imposição das sanções administrativas (agosto de 2021). No substitutivo, manteve o disposto pela Medida Provisória (MP) 959/2020, que adiou de 14 de agosto deste ano para 3 de maio de 2021 a data de entrada em vigor dos demais artigos da LGPD.
Tebet argumentou que a mudança feita pela Câmara não pôde ser acolhida por um problema de técnica legislativa. Como a MP 959 ainda não foi apreciada pelo Congresso, a relatora argumenta que seu conteúdo pode vir a ser rejeitado integralmente, pode ter o dispositivo referente à data da entrada em vigor suprimido, ou caducar por não ser aprovado pelo Congresso dentro do prazo constitucional.
O texto, no entanto, passou por mais uma alteração no Senado. O senador Weverton (PDT-MA) apresentou um destaque para que a lei passe a valer a partir de agosto deste ano, com a ressalva de que os artigos que tratam das sanções só entrarão em vigor em agosto de 2021.
Para o senador, essa mudança é importante para o enfrentamento das notícias falsas. Levado a votação, o destaque foi aprovado por 62 votos a 15.